A Força do Peruche


Zebu Branco e Gilberto Bonga – Carnaval 1957
Foto: Acervo Ney Silva

” Peruche, hoje a razão me fez pensar …” (Fernando Bom Cabelo)

Olhar o cenário do grupo principal das escolas no carnaval e não ter a Unidos do Peruche presente é de tamanha tristeza pra nós sambistas. Aquele pavilhão verde e amarelo é pesado, é forte demais e tem uma representatividade imensurável.

Falar de Peruche é falar de território africano, é falar da gente preta paulista, é uma continuidade da nossa saga pelas terras nesse rincão, que além do trabalho forçado, contribuímos formidavelmente com nossos ritmos, danças, cantos e principalmente pelos batuques que originaram o samba. E o samba, a seresta, o choro, os batuques sempre estiveram no cotidiano da Casa Verde, Vila Espanhola, Parque Peruche, Imirim e adjacências.

Salve Carlos Alberto Caetano, o Sr. Carlão do Peruche, o grande líder e Cardeal do nosso samba, que encabeçou o nascimento junto com outros grandes como Sr Décio,Cachimbo, Dona Luíza, Dona Lele, Sr Alcides, Mestre Gilberto Bonga, Gilbertinho, Boi Lambeu, Brandãozinho e entre tantos outros.

“Chegou a Filial do Samba, aqui ninguém é bamba, mas tem um ideal, é incentivar, a genuína melodia nacional …” (B.lobo)

Escalada pelo prefeito Faria Lima para receber uma delegação da Mangueira no aeroporto, isso nos anos 60, a Unidos do Peruche fora com um time show com ritmistas, passistas, mestre-sala e porta-bandeira. Em menção ao samba de terreiro da Mangueira “Capital do Samba” o genial poeta B.Lobo intitulou humildemente o Peruche de “Filial do Samba”, respeitando a magnitude da verde e rosa carioca naquela altura.

Por falar em anos 60, foram anos de glória, para escola foram 4 títulos:
1962 – Castro Alves
1965 – IV Centenario do Rio de Janeiro
1966 – Homenagem a Carlos Gomes
1967 – Homenagem a São Paulo

“E o Rei Café, promovia festival, e fazia batucada no palácio imperial, tinha tambor, tamborim e afoxê, tinha mulata bonita que dançava o bebenguê …” (Geraldo Filme/B.Lobo)

Nesse período travou um forte embate com a Nenê de Vila Matilde perdendo títulos que foram carnavais arrematadores como 1969 História da Casa Verde e o de 1970 Rei Café, onde a escola arrastou multidões no Vale do Anhangabaú.
Um detalhe interessante: em 1965 com homenagem de São Paulo aos 400 anos do Rio de Janeiro, a escola desenvolveu o tema na temática festiva homenageando o médico Oswaldo Cruz, e inclusive fora convidada para se apresentar na abertura do carnaval carioca nos dois dias de desfiles: na sexta e no sábado de carnaval.

A escola era a maior de São Paulo em matéria de componentes, naquela altura já contava com 1000 e a bateria com quase 300 batuqueiros sob a firme batuta de Gilberto Bonga. Infelizmente os ônibus prometidos pela RioTur não chegaram e o acordo dos cariocas eram disponibilizar o antigo trem SP-RJ. Sr. Carlão do Peruche negou a ida da escola, sendo assim, pois a viagem era muito mais longa e demorada, o que causaria um desconforto para seus componentes. Portanto, a escola foi reintegrada ao desfile paulistano onde sagrou-se campeã.

” Trazemos nessa avenida colorida, festa do povo e costumes tradicionais, dar ao povo o que é do povo … é o que faremos nesse carnaval …” (Geraldo Filme)

Com a passagem dos cordões para escola de samba em 1971, a disputa passaria ficar mais acirrada. A chegada da Mocidade Alegre que era bloco ao cenário das escolas de samba, marca um período novo no carnaval – trazendo inovações e já sagrando-se tri-campeã de 71 até 73 e com sua migração para a Avenida Casa Verde muitos componentes acabaram deixando o Peruche migrando para a Morada do Samba. O terreiro do Caqui na antiga rua 1, hoje Epaminondas Melo do Amaral deixou de ser o local do samba, aquele espaço de terra batida acabou deixando saudades e ficando para traz. Foi conquistado um espaço na Rua Adelaide, onde houve um triste episódio de repressão por parte da Força Publica (hoje Policia Militar). Em 1971 com o enredo Tradições e Festejos de Pirapora, foi a vice-campeã.

De 72 em diante, foram anos difíceis para a escola, nunca mais esteve entre as primeiras. Em 1972 o enredo Heróis da Independência gerou perseguição por parte do DOPS, inclusive Geraldo Filme e Sr. Carlão foram perseguidos. Perdeu a sua quadra em 1976. Geraldo Filme que que desde 1960 junto com B.Lobo fazia os sambas, acabou migrando para o Vai-Vai. Gilberto Bonga deixou a bateria para ajudar a Rosas de Ouro, depois sagrou-se campeão na Mocidade Alegre. Em 1980 foi rebaixada, mas voltou campeã em 1981 do grupo de acesso voltando pro grupo especial em 1982.

“Ie re re, ie re re re o … é a Peruche que chegou! “

A partir de 1984 com a visão empreendedora de Walter Guariglio. o saudoso Valtinho, foi construída a quadra atual na Ponte do Limão, com a vinda da puxadora Eliana de Lima, Mestre Lagrila e o carnavalesco Raul Diniz, a escola começa uma nova era e volta estar entre as grandes. Volta a realizar os ensaios na Rua Zilda reaproximando-se da sua comunidade. Para o carnaval de 1989 o presidente Valtinho trouxe Laíla e sua comissão de carnaval, Joaozinho 30 e Jamelão que já havia cantado em 1988, assume o microfone sozinho. Com o enredo falando dos orixás e saindo da Tiradentes com gritos de “é campeão” a escola ficou com o vice-campeonato, fato que aconteceria novamente em 1990.

Em 1994 em virtude de um forte temporal que castigou a passagem da escola, vários problemas foram ocasionados por causa disso, em alegorias e fantasias, a escola foi penalizada com 18 pontos, o que tirou o título novamente do Peruche que mais uma vez embargaria o grito de campeão.

Daí em diante infelizmente a escola nunca mais voltou figurar entre as campeãs, em 1998 fez um bom desfile com Mama África, mas ficou só com o 7º lugar. Caiu de grupo subsequentemente, mas voltava sempre no ano seguinte para o grupo principal. Infelizmente hoje a escola figura no grupo de acesso II, correspondente a terceira categoria do carnaval paulistano. A nossa torcida é para que a nossa escola querida, novamente desça a rua Zilda, pois como diz Sr. Carlão:

“Peruche é, não leve a mal, a grande campeã de carnaval …”

Dedico este texto ao meu pai Jair Praxedes – perucheano desde 1963, ao Sr. Carlão do Peruche que é padrinho do GRES Quilombo, ao Zé Maria grande intérprete, ao saudoso Gilberto Bonga, aos saudosos Catimbau, Cid Gomes, Fizó, Zebu Branco, Zebu preto, Ticão, Sarará, Irajá, Rubão do Prato, Tio Jaú, meu primo Marquinhos Trindade, Tio Claúdio, Mestre Magui, Zinho, Odirley Isidoro, Ney Silva, entre outros perucheanos de ontem, de hoje e do amanhã!

Resistência, luta, africanidade – Salve Unidos do Peruche

Axé!
Mestre Thiago

Roda de Samba na Escola Quilombo.
No destaque – Jair Praxedes, Sr. Carlão do Peruche e Thiago Praxedes

 

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Thiago Praxedes